As notícias da tragédia de 2010: os incêndios florestais



De um momento para o outro, o inferno de chamas, que rodeava Ribeira de Pena e Boticas desde segunda-feira, foi-se, com os aguaceiros que caíram na região de Trás-os-Montes. Mas a chuva foi, em alguns casos, de enxurrada, e até arrasou culturas em Chaves...
Um inferno, o fim do mundo, uma coisa que nunca ninguém viu…Era assim que, ontem, a população de Covas do Barroso, Boticas, recordava o incêndio que no dia anterior queimou pinhais e pastagens, destruiu vacarias e matou seis vitelos.
Só a chuva que caiu (e provocou uma enxurrada em Chaves, ver página ao lado), ao meio da tarde de ontem, pôs fim ao incêndio que desde segunda-feira concentrou as atenções dos meios da protecção civil e transformou num pesadelo a vida das populações de algumas aldeias de Ribeira de Pena e de Boticas. Pelas contas do governador civil de Vila Real, Alexandre Chaves, terão ardido, pelo menos, seis mil hectares de pinheiro bravo.
“Milagre? Milagre era se viesse ontem. Agora faz falta, até para a agricultura, mas ontem é que fazia falta”, insurgia-se, ontem, o morador de Covas do Barroso, Napoleão Fernandes, referindo-se à chuva que, finalmente, acabara com o incêndio.
Agora as suas pernas já não lhe permitem fazer o que quer. Quando era novo e havia incêndios chegava-se tanto às chamas que até ficava com os braços empolados. Impotente, ontem, passou a tarde a ligar para os jornalistas. “Peguei na lista telefónica, era para os que apareciam. Só não dei com o da TVI. Disse-lhes :“quando foi por causa do padre viestes cá todos, agora para mostrar esta desgraça ao mundo não vem cá nenhum?”, lembra Napoleão, com um pau numa mão e enxada na outra.




A mulher, Maria Luísa, também não ganhou para o susto. “Era um cordão de lume daqui, um cordão de lume além... estávamos rodeados. Dizem que o fim do mundo é com fogo, pois ontem foi o que pensei: estamos no fim do mundo”. O dono de um café passou a noite quase em claro. “Acho que ninguém dormiu! Nunca fui ao inferno, não sei como é, mas era o que isto pareceria ontem”.
Brasília Fernandes, de 50 anos, está no fundo das escadas a partir fruta podre para a fazenda. O marido Francisco Costa e o irmão “estão a comer qualquer coisa”.
“Ontem não comeram nada. E eu pouco, comi uma malga de leite e vomitei-o. Não se me engole nada!”, diz. Brasília e Francisco foram o casal a quem o fogo mais prejuízo causou. “Era tanto fumo, que uma pessoa não sabia onde punha os pés. O meu irmão, coitado, trazia um pulverizador, regava um bocadinho o chão, o fumo levantava e lá conseguiu tirar os dois tractores, mas aos vitelos já não lhe pudemos valer”.
Além dos seis vitelos mortos, dois geradores, dois reboques, uma carrinha, uma caixa cheia de milho, Francisco ainda ficou sem mais de 2000 e tal fardos de feno. “Ele faz-se forte, mas ontem quando se encostou para descansar um bocadinho, só dizia: o que vai ser da minha vida”, recordava a mulher, de lágrimas nos olhos.
Em comunicado, ontem, a Câmara de Boticas anunciou que iria proceder ao levantamento “exaustivo” dos prejuízos para os comunicar ao Governo, “por forma a que os agricultores possam vir a ser indemnizados”. “Caso contrário, a sua sobrevivência poderá estar em risco”.

5 comentários:

Anónimo disse...

os comandantes de bombeiros são escolhidos por poliicos depois ate os incendios andam como o país!! Será que o CMDT dos bombeiros d botica foi escolhido peo Sr. Presidente da Camara?

Anónimo disse...

Se os bombeiros não brincassem aos conta-fogos o lume não se propagava tão rapido. Mesmo depois deavisados que lume passava o rio eles diziam nãoser 1 bixo de 7 cabeças! Depois foi o que se vui.

Miguel Martins disse...

Anónimo - Parecem-me importantes as duas questões que levanta aqui:
1. a (in)dependência dos corpos de Bombeiros do poder político-partidário;
2. a forma como no terreno se procede ao combate aos incêndios florestais.
Reconheço-lhes a importância mas confesso que não tenho preparação, nem conhecimentos técnicos, para fazer grandes críticas. Dessas e de outras questões associadas (gestão da floresta, incentivos económicos às populações, etc.) tenho apenas opiniões pouco fundamentadas, como qualquer cidadão as terá.
No entanto, estive a fazer uma pequena pesquisa nos sites http://www.bombeiros.pt e no site da Autoridade Nacional de Protecção Civil (http://www.prociv.pt) e deparei-me com alguma informação interessante. Existem quatro tipos de corpos de bombeiros em Portugal: bombeiros profissionais, bombeiros mistos, bombeiros voluntários e corpos privativos de bombeiros. Apenas os dois primeiros dependem das Câmaras Municipais.
Em Boticas, segundo sei, existe uma corporação de Bombeiros Voluntários. Como tal, esta corporação pertence a uma associação humanitária de bombeiros. Dessa forma, compete à Direcção dessa associação nomear ou demitir o Comandante dessa corporação. Independentemente da omnipresença (boa ou má) que, em terras pequenas, e mesmo em outras maiores, os presidentes de câmara têm, parece-me que formalmente quem nomeou o comandante dos Bombeiros da referida localidade terá sido o Sr. Fernando Queiroga (presidente da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Boticas e também Vice-presidente da Câmara Municipal de Boticas) e não o Sr. Fernando Campos.
Numa rápida consulta na internet pode obter cópia dos estatutos da Associação (no site da A.N. de Protecção Civil). Também poderá assistir ao vídeo das comemorações do 39º aniversário da referida corporação, no YouTube (www.youtube.com/watch?v=-q6XSKbCv98).
Porém, na minha opinião, antes de se discutir quem nomeou o Comandante dever-se-ia discutir sobretudo a sua competência ou incompetência para liderar a dita corporação. Só depois dessa discussão feita é que se deveria passar para a questão da nomeação. (Escrevo isto relativamente longe do concelho e também não sei se essa discussão está a ser feita)
Confesso, como disse acima, que não tenho grandes capacidades ou informações para avaliar a competência de quem lidera o combate aos incêndios florestais no concelho de Boticas. Francamente não sei se o Comandante dos Bombeiros e a corporação que ele lidera são bons ou maus. Esse julgamento será para quem de direito.
Acredito também que o presidente da Câmara de Boticas, o Eng. Fernando Campos, pela sua área de formação, pela experiência profissional e pelo tom das críticas que faz terá ideias bem fundamentadas sobre as questões relacionadas com a gestão da floresta e com os incêndios florestais. É nestes assuntos que se deve exercer o magistério de influência. Todas essas questões devem ser – penso eu! – bem ponderadas.

Miguel Martins disse...

O que eu tenho pena é que só em Covas do Barroso tenham ardido tantos hectares de floresta e terrenos agrícolas – 3000, segundo me informaram. Tenho desgosto que tantas pessoas tenham sido prejudicadas (algumas de maneira muito séria) e agora tenham de fazer contas à vida. Tenho mágoa que a natureza, os seus animais e os outros seres vivos em geral tenham morrido ou sido severamente maltratados. Entristece-me que as pessoas de Covas tenham de olhar permanentemente para as serras circundantes, ver as feridas que o incêndio deixou, lembrarem-se do que aconteceu e pensarem que têm de esperar mais de 20 anos para voltarem a ver as árvores crescidas, ansiando que não volte o fogo e coma tudo novamente.
O que eu espero é que depois da desgraça se apurem todas as responsabilidades que se tiverem de apurar e se comece a pensar como revitalizar a floresta. Sei que a natureza tem as suas formas de resistir e que o verde voltará a emoldurar essa aldeia. Deixo aqui duas perguntas: Vai-se deixar a coisa à vontade de Deus ou os homens vão fazer alguma coisa? De que maneiras podemos nós ajudar ou pelo menos não prejudicar essa revitalização?
Uma coisa que me disseram há bem pouco tempo e que me deixa a pensar é que, de momento, não se ouve o chilrear dos passarinhos em Covas do Barroso? Desapareceram os pássaros! Hão-de voltar! Eu só peço que não desapareça a Boa Vontade e essa às vezes tarda!

Miguel Martins disse...

Desculpem lá a dimensão dos comentários mas tinha de ser!